Bem No Meio
No meio de
toda a cidade, onde me acho?
Comecei a
procurar no outro o que estava em mim e olhando para fora, me senti só, porque
eu não estava lá. Eu não sou aquela que olha no espelho. Aquela mente para mim.
Diz que estou envelhecendo, que não tive filhos, que não sou casada, que
morrerei só.
Aquela diz
coisas que não quero ouvir.
Aquela tem
medo, sofre, chora, ama, ri, fica doente, ajuda pais e amigos, ouve os
sofrimentos dos outros, sofre com eles, tem insônia, amarrota a roupa, não lava
a louça, solta pum, tem azia, má digestão, dor de cabeça.
Aquela sente
coisas que não quero sentir.
Aquela tem
uma história que não é a que eu gostaria de contar, porque ninguém tem que
saber da gente, só a gente, porque queria ter tido outros problemas, ou se
tivesse tido os mesmos, que pudesse ter feito com eles, outras coisas, não o
quê fiz.
Aquela viveu
de um jeito que eu não quero viver.
Aquela reage
sempre da mesma forma, fica presa a um redemoinho de emoções, aos pais, ao
chefe, à vida, à perda, tudo quase igual, desde menina, desde, desde, desde...
Aquela pensa
de um jeito que não quero pensar.
No meio de
tudo isso, onde me acho?
Sinto-me
entre duas paredes de arranhas-céus muito altos e elas vão se fechando sobre
mim, comprimindo meu peito junto as buzinas. No fundo, ainda ouço o barulho da
geladeira da minha casa, como se houvesse silêncio a minha volta.
Parando de
procurar, será que acho?
Parando de
achar, será que...
E aquela que
olha no espelho, aquela que não quero olhar, quando pensa nisso tudo, relaxa,
porque sente-se vingada, não é só ela que sofre. Eu também sofro agora.
Mas parando,
será que...
Acho que ...
Ach...
Parou.
Silêncio no
fundo.
A cabeça
parou, por um instante. Aquela que não existe... Mas e eu?
Voltei a
achar, voltei, voltei, voltei, como um carro que deu uma pequena engasgada.
Acho que a
geladeira quebrou. Tá um silêncio...
Estalo.
Não quebrou
não.
Onde estou?
Bem no meio.
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